sexta-feira, 16 de julho de 2010

Sobre Cuba - Da revolução à decadência

Revista Veja
A virada socialista de 1959 e o isolamento pós-soviético, nos anos 90

Cuba foi um dos últimos países a se libertar do domínio espanhol. Sua independência foi em muito patrocinada pelos Estados Unidos, que tinham interesse econômico na ilha. Cuba era próxima à Flórida, possuía grandes belezas naturais e era a principal produtora mundial de açúcar. O grande herói da independência cubana foi o poeta e jornalista José Martí, porém ela não teria se concretizado sem a "ajuda" dos norte-americanos. À beira da revolução, o clima em Cuba era tenso. Explodiam revoltas que buscavam a sua independência. O patriotismo aflorava em busca da liberdade. Com o apoio dos EUA, a vitória cubana foi fácil. Mas Cuba saiu da dominação espanhola e passou a ser dominada pelos EUA. Em 1901 foi incorporada à Constituição cubana uma emenda que previa a "doação" da Baía de Guantánamo para os norte-americanos instalarem uma base militar. Ao longo de cinco décadas, ditaduras mantidas pelos EUA foram instaladas em Cuba. Em 1953, o ditador era Fulgêncio Batista, que governava segundo os interesses de empresas transnacionais. Os cubanos não tinham poder de decisão sobre seu país e a liberdade era uma utopia. O povo não estava ao lado de Batista e passou a contestar seu despotismo. No mesmo ano, um grupo de jovens, comandado por um ex-líder estudantil e jovem advogado chamado Fidel Castro, atacou a Fortaleza de Moncada, em Santiago. Objetivavam tomar armas para financiar uma revolução. Mas fracassaram e somente 30 dos 150 revoltosos sobreviveram. Estes foram condenados à prisão e, depois de cumprirem parte da pena (Fidel cumpriu 22 meses), foram anistiados e banidos de Cuba. Foram derrotados, mas Castro passou a ser uma referência na luta contra Fulgêncio Batista.

Exilaram-se no México, reorganizaram-se e começaram a treinar para uma nova tentativa de revolução. Nesse momento Ernesto Guevara, o Che, aderiu ao grupo. Também faziam parte dele Camilo Cienfuegos e Raúl Castro, irmão de Fidel. Constituíram o Movimento Revolucionário 26 de Julho. Em novembro de 1956 partiram de um porto mexicano no iate Granma com destino a Cuba. Eram 82 pessoas armadas com dois canhões antitanque, 35 rifles com mira telescópica, 53 fuzis mexicanos, 3 metralhadoras Thompson e 40 metralhadoras leves. Os motores defeituosos e a sobrecarga do Granma, bem como o mau tempo e erros na navegação atrasaram a chegada dos revoltosos. Com isso, o governo de Batista, sabendo da tentativa revolucionária, organizou um contra-ataque. Logo após o desembarque as tropas do governo dizimaram os revolucionários. Os únicos doze sobreviventes dispersaram-se e se embrenharam na mata. Quase sem comida, desprovidos de água, com poucas armas e em condições físicas horríveis, caminharam durante dias até chegarem a Sierra Maestra, onde se reuniram novamente. Sobreviveram graças ao apoio que receberam dos camponeses. Os remanescentes do grupo, liderados por Fidel, Che, Raúl e Cienfuegos, juntamente com os novos recrutados, foram obtendo importantes e estratégicas vitórias contra as tropas governistas. Numa verdadeira epopéia, a guerrilha revolucionária caminhava rumo à capital cubana. Com a vitória final finalmente consumada, Fulgêncio fugiu do país e no dia 1º de janeiro de 1959 as colunas guerrilheiras tomaram toda a ilha.

Guinada socialista - Um novo capítulo da história cubana começava. Fidel Castro projetou um governo fortemente nacionalista e disposto a combater a corrupção. Houve, então, a ampla reforma urbana e agrária, o aumento da construção de escolas e hospitais, a distribuição mais igualitária da renda, as maciças campanhas de alfabetização, a nacionalização das empresas, a elevação dos níveis salariais. Em abril de 1961, Fidel Castro, em célebre discurso, finalmente anunciou que Cuba se tornaria um país socialista. Assim, aproximou-se da URSS em busca de ajuda militar, técnica, financeira, econômica e diplomática. A URSS passou a comprar açúcar a preço acima do mercado e a vender petróleo mais barato para Cuba. A URSS financiou Cuba para ter um modelo socialista no continente americano. Em represália, os EUA impuseram um bloqueio comercial contra a ilha, e obrigaram outros países a fazê-lo também - na América, somente o México não aderiu. Também romperam relações diplomáticas e tentaram, sem sucesso, invadir Cuba, a partir da Baía do Porcos. Para evitar mais invasões, os soviéticos, então comandados por Nikita Krutchev, instalaram mísseis nucleares em Cuba. Kennedy, o então presidente norte-americano, ordenou um bloqueio naval à ilha. URSS e EUA quase promoveram uma hecatombe nuclear, mas acabaram acertando um acordo que determinava a retirada dos mísseis russos e o compromisso dos EUA de não mais invadirem Cuba. Esse episódio ficou conhecido como a Crise dos Mísseis.

Com o colapso da URSS no final de 1991 as dificuldades de Cuba foram agravadas. Já não podia mais vender seu açúcar para a URSS acima do preço de mercado e comprar petróleo barato. Além disso, os EUA agravaram o embargo comercial contra a ilha em 1992 e 1996. Cuba tornou-se, assim, um país relativamente isolado do resto do mundo. Com pouco petróleo, os cubanos tiveram de encontrar meios de locomoção alternativos, como a bicicleta. Os índices sociais decaíram. Sem poder comercializar com boa parte dos países do planeta, Cuba teve seus recursos financeiros prejudicados. A ilha hoje abriga um ditador em decadência senil, presos políticos, um paredão onde três dissidentes foram executados em 2003, prisioneiros de guerra, militares americanos e uma onda de cidadãos que tentam, dia após dia, deixar o país a bordo de um bote inflável. Em Cuba, cercada de mar por todos os lados, convivem o inigualável poderio americano e o desafio insistente a ele levantado pela revolução de Fidel Castro, a idéia da liberdade e sua negação, as filas para comprar comida e as comodidades do fast food e outros paradoxos. Nos estertores de um regime que parece não acabar nunca, o fuzilamento de três cidadãos que seqüestraram um barco para fugir da ilha e a condenação de mais 75 pessoas a penas que chegam a 28 anos de prisão por delito de opinião abalou a fé até mesmo de grandes admiradores de Fidel Castro. O escritor português José Saramago, prêmio Nobel de Literatura de 1998, velho amigo do regime castrista, finalmente rompeu com ele.

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