terça-feira, 20 de abril de 2010

Agência chama criança de Pateta para vender viagem

Folha de São Paulo - TALITA BEDINELLIda Reportagem Local

Renata, 11, combinava com uma amiga viajar em julho para a Disney. Questionada pela mãe, que não sabia de excursão nenhuma, a menina pegou uma pasta com preços do pacote tu­rístico e uma foto em que, ao la­do da colega e de um boneco do personagem Mickey Mouse, segurava a placa com os dize­res: "Se eu não for para a Disney vou ser um Pateta".
A pasta foi entregue na escola onde a menina estuda, o Liceu Di Thiene, em São Caetano(Grande São Paulo), no começo do mês passado. Era uma pro­moção da agência de viagens "Trip&Fun", que organiza via­gens de crianças e adolescentes também para Cancún, Barilo­che e Costa do Sauipe.
Com a publicidade que já le­vou o personagem da Disney para dentro de mais de dez es­colas, e tira fotos com as crian­ças segurando plaquinhas co­mo a do Pateta, a agência levaráem julho cerca de mil criançaspara o parque em Orlando. Os pacotes custam a partir de R$5.216, para 13 dias em quarto quádruplo (o mais barato).
"Quer dizer que você é uma pateta porque você não vai?",perguntou à filha Renata a pe­dagoga Roberta, 40.
A menina diz que ficou triste. "Queria muito ir. Quase todomundo da sala vai", conta. Para a mãe, que fala em processar a agência, o sentimento predo­minante foi a vergonha em re­lação aos colegas. "Ela ficou cla­ramente constrangida."
A agência e a escola afirmam que não pretendiam constran­ger ninguém e que a placa do Pateta era apenas uma brinca­deira.
O promotor da área do con­sumidor João Lopes Guima­rães Júnior diz que o caso ilus­tra bem os abusos na publicida­de infantil. "De uma turma de cem crianças, 80 vão viajar. As que não vão, porque os pais nãoquerem ou não têm dinheiro,serão chamadas de Pateta. Já temos problemas sério de bull­ying nas escolas. Essa empresa está criando uma situação pro­pícia para isso. Como se pode falar em preservação da ima­gem da criança com esse tipo de publicidade?", diz.
Publicidade infantil
Para o promotor, a ação da agência de turismo fere os arti­gos 15 e 17 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), que prezam pelo "respeito à digni­dade e a inviolabilidade da inte­gridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente".
O Instituto Alana, ONG que trabalha para regulamentar a publicidade infantil, critica as ações em escolas. "Muitas ve­zes, acontece e o pai nem sabe. É absurdo isso ser feito dentro das escolas", diz Laís Fontene­ lle Pereira, coordenadora de educação da ONG.
O Conar (conselho de autor­ regulamentação publicitária) já baniu propagandas por consi­derá-las desrespeitosas, como uma do ovo de Páscoa Traki­nas, de abril de 2008, que dizia: "Quem não dá ovo é um mané".

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